
BREVE HISTÓRIA DO RELÓGIO
Não há conhecimentos precisos de quando e como é que surgiu o primeiro. A informação é muito pouca, perdendo-se no tempo e não definindo com alguma precisão a fronteira entre o relógio mecânico de torre e todos os restantes.
É atribuído ao povo chinês a primazia na criação de um escape mecânico. O seu inventor seria o monge budista, notável matemático e astrónomo de seu tempo I-Hsing (682-727). Presume-se que o aparecimento de relógios totalmente mecânicos, tenha sido na Europa ao final do século XIII. A primeira aparição historicamente comprovada, ocorre em Milão, em 1309, quando é colocado o relógio na torre do campanário de São Eustórgio. As torres de vigia e das igrejas tornaram-se torres de relógio, donde soavam horas iguais para o serviço das comunidades quer monásticas quer seculares. O primeiro mostrador tinham 6 divisões, que um único ponteiro percorria 4 vezes cada dia de 24 horas, e foi criado em 1344 por Jacopo de Dondi na cidade de Chioggia em Itália. O artesão foi honrado com o título "Del Orologio" que passou a ser o seu apelido de família. Não havia ainda ponteiro de minutos, que só surgiria mais tarde com a adopção do pêndulo.
Os relógios mecânicos, desde o início até fins da Idade Média (1300-1450), empolgaram de tal forma o homem, que foram considerados como símbolos do equilíbrio, da sabedoria e da virtude, Boa parte dos relógios construídos nesse período, e mesmo posteriormente, apresentavam figuras e desenhos alusivos a essas nobres qualidades que o homem deveria possuir; isto quando não se referiam directamente à inexorabilidade do escoar do tempo, como é o caso do relógio da Catedral de Estrasburgo.
Na torre da Catedral de Salisbury, Inglaterra, em 1386, e noutra torre construída em 1389 na cidade de Rouen, França, foram instalados relógios cujo tempo era medido pelo movimento mecânico periódico de uma pesada barra empurrada, ora num sentido, ora noutro, por uma roda dentada que avançava por um espaço de dente a cada oscilação dupla, roda, esta, que era movida por um peso suspenso em um tambor. Por serem movidos por pesos, os relógios tinham de ser fixados em posição vertical para que funcionassem correctamente.
O relógio mecânico de pesos deriva da clepsidra (relógio hidráulico), com mecanismos de engrenagens, que, provavelmente, sejam dotadas de algum elemento regulador que contenha o movimento do sistema, mantendo sua rotação dentro de um ritmo simétrico.
Era fácil regular a saída da água de uma clepsidra: bastava aumentar ou diminuir o orifício onde escoava o líquido. Mas, ao tentar criar um escape mecânico, o homem sentiu a magnitude de um problema simples, mas que demorou vários séculos para ser desvendado. O escape, como regulador da marcha dos relógios mecânicos, foi o órgão que permitiu o evento desses relógios, já que as engrenagens já eram conhecidas há tempo, tal como o movimento de um conjunto de engrenagens por meio de um peso.
O tão decantado engenho do homem foi posta à prova quando se concluiu que, para construir um relógio essencialmente mecânico, precisava-se contar com um elemento regulável que contivesse o andamento das suas engrenagens, mantendo-as dentro de uma rotação tal, que permitisse fazer girar a última roda do conjunto de engrenagens, tão vagarosa e regularmente, que propiciasse, com segurança, a contagem de um razoável espaço de tempo.
Com a descoberta das oscilações pendulares – "o tempo de oscilação do pêndulo independe de sua amplitude" - por Galileu Galilei (1564-1642), no final do século XVI, passou-se a utilizar o pêndulo para a construção de relógios mais precisos.
Os fabricantes de relógios foram os primeiros a aplicar conscientemente as leis da física e da mecânica ao fabrico de máquinas, na base de uma colaboração entre cientistas e artesãos que forneceu a tecnologia base das máquinas e ferramentas. Os dois elementos principais são a roda dentada e o parafuso, possíveis devido ao desenvolvimento das técnicas de corte dos dentes das engrenagens, e pelo torno de metal.
O parafuso de madeira, cujos sulcos eram marcados e abertos à mão, era há muito utilizado na prensa dos lagares de vinho, na irrigação, e mais tarde na cunhagem de moeda e na imprensa.
Juaneto Torriano Cremona (1501-1575) executou a primeira máquina de corte de engrenagens que no século XVII se tornou comum nas oficinas de relojoaria francesa e inglesa. Só em 1480 um relojoeiro alemão concebeu um pequeno torno operado à manivela e equipado com uma "espera corrediça composta". Todos os tornos posteriores são desenvolvimentos dos inventados pelos relojoeiros. O relojoeiro suíço Ferdinand Berthoud fabricou a primeira máquina de corte de parafusos automática (1763), e foi pioneiro na divisão do trabalho, listando 16 tipos diferentes de trabalhadores implicados na fabricação dos relógios, assim como 21 diferentes tipos de "relógios de usar".
EM PORTUGAL
Portugal nunca teve tradições de criações industriais e muito menos no caso específico de mecânica de relojoaria de torre. Até ao princípio do século XX, mais propriamente até á implantação da República, os relógios mecânicos que eram instalados nas torres das Igrejas, Monumentos e outros edifícios públicos, eram importados sobretudo da Bélgica Flamenga, Holanda, França e Inglaterra (muito pouco) pois os nossos monarcas tinham uma relação muito estreita com a nobreza, hábitos e costumes desses países.
O caso mais flagrante são os carrilhões do convento de Mafra, mandados construir na Flandres e na Holanda por D. João V. Só o ouro vindo do Brasil e a megalomania doentia deste tão peculiar monarca é que justifica a montagem de dois maquinismos mecânicos de descomunais dimensões em cada uma das duas torres do referido monumento.
Existiram algumas tentativas frustradas de certos forjadores que habitavam nas serras da beira interior, de construírem nas suas rudimentares forjas "sopradas" a fole manual, algumas maquinismos divisores do tempo com o intuito de assinalar a hora do desvio da água para as regas comunitárias.
Esse divisor do tempo estava instalado no interior da torre da capela da aldeia e fazia accionar um pequeno malho de ferro que tocava na sineta existente, anunciando assim as horas solares e não as horas oficiais. A mudança do curso da água de uma porção de terra de um proprietário para o outro, era comandado pelo horário solar.
Estes maquinismos eram manufacturados com barras de aço mole, mais conhecido por ferro, aproveitado de algumas sucatas velhas e abandonadas. A estrutura dos mesmos não comportava parafusos, além de serem raros eram muito caros, sendo substituídos por pequenas cunhas de ferro forjado, embutidas em orifícios que eram rasgados no barramento ao rubro. Os dentes das rodas eram abertos manualmente e os terminais dos veios que comportavam as rodas moviam-se em furos abertos directamente naquilo a que se podia chamar de chassi.
A lubrificação das peças e rodas era feita com azeite, banha de porco ou cebo.
Ainda existe alguns exemplares destes maquinismos totalmente degradados e abandonados em muitos palheiros e pequenas lixeiras por esse Portugal interior. A fotografia acima, mostra um marcador do tempo, com mais de 200 anos, completamente abandonado e coberto de excrementos de pombo.
Após a implantação da República a tradição foi quebrada, passando a França ser o país de origem dos relógios mecânicos de torre, importados por alguns ourives-relojoeiros de lupa, localizados em Lisboa, Porto e Albergaria-a-Velha.
Após a Primeira Grande Guerra 1914-18, surge em Portugal o primeiro fabricante de relógios mecânicos de torre. Foi em 1930 que Manuel Francisco Cousinha fundou na então pequena Vila de Almada, a primeira e única fábrica de relógios mecânicos de torre. Durante 50 anos, (de 1930 a 1980) construíram-se e instalaram-se aproximadamente 2.000 relógios mecânicos de torre tanto em Portugal Continental, como Açores, Madeira, antigas colónias e alguns países por todo o mundo.
Presentemente continuamos a assegurar, quando solicitados, o bom funcionamento das máquinas existentes e ainda em funcionamento, como as recuperamos com 10 anos de garantia. Desde a reconstrução, ao restauro ou reparação, temos todos os meios técnicos para elaborar um trabalho de qualidade e segurança, conforme demonstrado nos exemplos expostos.
CRONOLOGIA
1090 - O chinês Su-Sung publica um tratado sobre relógios de torre, movidos a água.
1251 - O arquitecto Villard desenha um escape de relógio.
1292 - É construído o relógio da catedral de Canterbury.
1549 - Os portugueses introduzem no Japão os relógios mecânicos.
1582 - Galileu Galilei descobre o isosincronismo das oscilações do pêndulo.
1640 - Galileu Galilei, com 76 anos e cego, dita a seu filho e a seu aluno Viviani
todos os detalhes que permitiram a estes desenhar o célebre relógio de Galileu, provido
de um pêndulo e um escape livre.
1650 - Christian Huygens planeja a aplicação do pêndulo nos relógio.
1657 - É construído o primeiro relógio a pêndulo pelo relojoeiro Salomão Coster, de Haia.
1717 - D. João V mandou construir o Palácio de Mafra, cumprindo assim uma promessa, caso a Rainha D. Maria Ana de Áustria, sua esposa, tivesse descendência.
1744 - Concluída a construção do Palácio de Mafra, onde estão instalados nas suas duas torres, 114 sinos dos quais 48 formam quatro oitavas, tocadas por dois monstruosos relógios mecânicos situados em cada uma das torres do edifício.
1748 - Pierre Le Roy apresenta à Academia de Ciências de Paris um escape livre.
1808 - Inicio da 1ª invasão francesa comandada pelo general Junot iniciando-se também um ciclo de pilhagens e roubos de um grande número de sinos de bronze, levado a cabo pela tropas francesas, para fazer balas para os canhão.
1930 - Fundada por Manuel Francisco Cousinha, na então vila de Almada, a primeira e única fábrica de relógios mecânico monumentais.
1950 - Criação por Manuel Francisco Cousinha do chamado relógio electrónico "A Voz Camapanil", mais conhecido por relógio de altifalantes.
1954 - Inicio do restauro do carrilhão mecânico da torre sul do convento de Mafra.
1961 - 21 de Outubro - Faleceu Manuel Francisco com 68 anos de idade.
1963 - É montado em Portugal o primeiro relógio mecânico monumental, fazendo movimentar os ponteiros em dois mostradores de flores, no chão da rotunda do aeroporto de Lisboa, vulgo rotunda do relógio.
1980 - Fim da fabricação de relógios mecânicos monumentais.